BEM-VINDOS

Obrigado pela sua chegada; não se esqueça que é de AMOR AGAPIANO* que essencialmento poeto, também erótico quando a propósito de algumas circunstâncias episódicas nas mais diversas proporções. Como estou avança(n)do no tempo, não se escandalize, porque o que é preciso erradicar do Mundo é o preconceito secular, topo onde está preponderantemente a regressão da Humanidade neste percurso da condição humana, nem sempre adequada ao futurecer* do Homem, albergado corporalmente neste Planeta, sem saber com precisão, na generalidade, onde está a sua/nossa Alma. [ Obs. os astericos* assinalam dois neologismos da nossa Língua ].

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quinta-feira, 30 de abril de 2009

Nesta Visão - Daniel Cristal

 
Vai carregada a nau mas não hesita
a onda chega à borda do convés
e perde-se a seus pés com as marés
Ela vai carregada bem catita
 
Perece afundada a embarcação
mas fica imponente no horizonte
vai cheia vai pesada e é uma ponte
que liga o mar ao céu nesta visão
 
Desliza devagar tal é seu peso
evita naufragar a todo o preço
pois leva um tesouro bem galante
 
Em vez de ouro prata ou diamante
leva honra abençoada e bondade
e tudo o que faz falta à humanidade.
 

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Geometria relacional - Daniel Cristal


Traz o teu coração feliz
e o teu rosto iluminado
vem aqui para o meu lado
traça a nova bissectriz
 
Uma linha equidistante
que aproxime o nosso amor
traça-a com novo fulgor
a voz que a todos encante
 
Une todos os catetos
dá-lhe a forma de uma estrela
que ninguém deixe de vê-la
 
e anula os ângulos rectos
apaga a hipotenusa
luz então ó minha musa!

terça-feira, 28 de abril de 2009

Aparição - Daniel Cristal


Emergiste bela musa do salgado mar,
amazona de outrora recordando o trilho
do Sol-rei reflectido e a espelhar
esses longos cabelos de sedoso brilho!

Tremia em ti a pele nas gotas de sal
teu rosto e ombros poliam cristais
teus seios luziam de creme animal
e tuas coxas coloriam rosados vitrais.

Na minha direcção, vinhas... Estava morno...
teus pés olhei melhor... não eram de sereia!
No meio das dunas rodeado de estorno,
aguardei-te deitado em cima da areia.

A ostentação tua era a minha sedução
e ao pisares areia, teus seios descompassavam
os ritmos certos do meu coração!

Já muito perto de mim, sorri por não seres ninfa...
tinhas poros húmidos que fremiam
o fervente vértice da linfa...

Cantámos então árias na comum ondulação...
Eu era o náufrago das dunas solitárias
e tu a jangada da nossa salvação...

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Transformação - Daniel Cristal


Fui apurando com o tempo os meus sentidos,
Buscando na raiz da terra alguns mistérios:
O meu rosto específico dos anos idos,
Revolvendo a forma dos godos-celtiberos.
 
E fui sumariando os frutos do saber:
Aqui uma laranja doce que amargava,
Ali um limão amargo por espremer,
Mais doce do que alguma vez se imaginava!
 
E concluí deste modo: o que hoje nos atrai
Amanhã nos afasta com uma palavra
Mal medida ou a atitude que tudo esvai...
 
E razões para quê? Se buscamos em vão
O mundo que ontem foi cinza, e hoje é lava,
E amanhã será gelo em transformação.

domingo, 26 de abril de 2009

O Ímpeto - Daniel Cristal


Breve e longo, comprido e curto,
nas línguas que à distância são o surto
do tempo que se expande até ao céu,
E ao sonho na renda do teu véu.
 
É bem longo o caminho das estrelas,
tão longo que me perco só em vê-las!
Mas tão curto é na luz da tua lua cheia
que invertebrado fico em sua teia!
 
Nunca foi revelado este enigma
Da contradição sábia, em que te beijo
No molde duma chama toda ígnea...
 
É o enigma depois  dum arrebate:
O tempo incontado em que te deixo
No beijo em que me dou, e nos abate.

sábado, 25 de abril de 2009

Liberdade - Daniel Cristal


Na empatia, acompanha-me, amigo,
acompanha-me na hora da incerteza!
Muito pouco construí do que persigo
ainda que com recurso à Beleza.
 
Dá-me a tua mão, segura na bandeira
que mostra a liberdade com vaidade,
luta pela palavra à minha beira,
transformando este mito em divindade.
 
Ser livre sem Justiça é opressão,
é igual à aparente irmandade,
na realidade igual à falsidade.
 
Na hora da incerteza, dá-me a mão,
ergamos mais um pouco o estandarte,
pois onde está, não passa de sonhar-te.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

A Nau Da Esperança - Daniel Cristal

 
Não a amedrontem nem tão pouco a estorvem
porque ela vai segura e decidida
a ancorar no cais de toda a vida
(mau grado os cães que latem mas não mordem)
 
Ela vai linda a nau da esperança
traz as virtudes que enchem a existência
de bênçãos, de alegria e da ciência
que transforma a ansiedade numa dança
 
Traz a sabedoria catapultada
a urgente mudança do presente
da meninice até à adulta idade
 
Transborda de amor alegremente
Ela ancora agora neste mundo
e o seu porão de luz jamais tem fundo.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

O abraço - Daniel Cristal


No espontâneo gesto benquerente,
permite que te abrace hoje e sempre
por gosto da amizade, pois que a sente
quem vê simplicidade à nossa frente.

Um abraço ao amigo, e um outro
ao amor que arrebata a emoção...
Um amigo, se o for, dá a mão
a quem se perdeu na ânsia dum besouro...

Dum besouro, ou do ouro muito fútil,
do ouro, ou da vaidade muito frágil,
da vaidade ou cobiça muito inábil...

Se ao amor dou o valor que lhe é útil,
e nos preenche uma vida com sentido,
também abraço o amigo mais querido.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

O universo - Daniel Cristal


I
 
Já alguma vez colocaram a hipótese de o Universo ser Nada, de não existir coisa nenhuma? Podia efectivamente não existir substância alguma. E se houvesse Nada, não haveria a consciência do que é existir. Existir nada, também seria uma forma de existir sem a consciência da existência. Nunca esse existir teria consciência de existir, assim, com carne e osso, um rosto, tronco e membros num mundo mais ou menos feito à nossa medida com necessidade de mais alguns ajustamentos futuros... provavelmente os mais importantes e definitivos. Se existisse Nada, a consciência seria obviamente nula. Nem haveria dor nem amor; nem mesmo uma ânsia-angústia, ou poder instintivo de vivência progressiva, radicada no neutrino, com uma energia sem matéria medível nem forma conhecida. Já imaginaram esse Tudo-Nada, o Vácuo, o Vazio infinito, a inexistência da matéria e forma, tais quais as conhecemos? Pois, se não imaginaram, imaginem, e toda a compreensão do mundo se altera como consequência! Somos, então, presumo, um produto com origem numa força etérea, duma obra que é feita momento a momento ao ser gerada evolutivamente, e em que todos somos agentes e resultado da nossa acção conjunta. Somos nesta ordem de ideias, creio eu, e começando logicamente pela origem, mais energia do que matéria. E também penso que ainda não nos apercebemos totalmente desta poderosa consciência do pensar/agir, capaz de realizar sonhos e utopias... consciência esta que poderia resultar num importante benefício urgente para toda a Humanidade.
 
II
 
Se não existisse substância alguma, Tudo seria Nada. Mas isto não quer dizer que estes dois semas, não existissem. Seriam capazes de existir sem a consciência, no caso do Tudo-Nada, ainda que essa consciência pudesse não ser revelada. A revelação vem da alteração do Nada para Tudo com o próprio surgimento desta faculdade. A metamorfose dá-se realmente pela transformação do neutrino em outra potência mais material, mais sólida, que não é mais casulo energético, depois da mudança. O girino será rã, o casulo será lagarta, a lagarta será borboleta, a semente será uma das espécies da flora, o botão, flor, sinais imperfeitos, poder-se-iam considerar, das alterações das formas e das substâncias. O aperfeiçoamento dos seres na evolução das espécies, adaptando-se cada vez mais às condições terrestres adversas, é uma luta energética a favor da continuação da vida nos seus diversos moldes e conteúdos. Afinal, a origem é a energia vital imprimida e programada, que comanda o percurso de todas as criaturas 'ab-initio' no estado em que se encontram neste Universo "misterioso". Esta compreensão ajuda-nos a entender a existência evolutiva de um Mundo que não é unicamente material, mas preponderantemente energético (espiritual, anímico). Interiorizada esta noção existencial, todos os universos paralelos, diafanamente estratificados, são possíveis, e ainda que variados (ou entendidos como diferentes na sua concepção), todos não serão mais do que a constatação de que eles existem, quanto mais não seja na mente de quem assim pensa com resultados consideráveis na validação de outros mundos, além deste substantivo, visível e pesável. Além disto, também sabemos que a força espiritual domina grande parte do trajecto do Homem no planeta Terra que o alberga. É comummente aceite (ainda que haja alguns poucos que se excluem desta conclusão) que a alma gera forças que condicionam o 'modus vivendi', e, se colectivizadas podem produzir efeitos modificadores e edificadores da consciência globalizada; pode ainda descobrir recalcamentos nefastos no indivíduo, o que é uma maneira de se poder corrigir actuações nevrosadas, doentias, basicamente, levando-nos à concepção de que é a alma que nos conduz. Podem especular quanto quiserem sobre distintas outras concepções gerais, porém, profundamente, o que importa é entender a essência do que está por trás de todas as possíveis aparências, mesmo que difiram conceptualmente entre si na sua idealização.
 
III
 
Se a luz do Nada cega o Tudo, a massificação do Tudo cega o Nada. E o mesmo acontece com a cegueira do Vazio, do Vácuo. E quem diz etéreo confunde-o com a imaterialidade. Só que o etéreo contém energia, essa que apesar de não ser perceptível, existe de facto.
 
Esta coordenação de ideias conduz-noz ao mundo da imperceptibilidade. Assim como existe o mundo pesável, medível existe outro que é etéreo, volátil, inverificável. Nem sequer esses "mundos" são paralelos, porque eles existem amalgamados, unificados. Mas se um deles parece amorfo, duma dureza quase impenetrável, a verdade é que é o outro (apenas distinguido por necessidade de o caracterizar pela diferenciação), que conduz simultaneamente a evolução de formas e substâncias unificadas. Como se fosse um motor com outro lá dentro: o primeiro rígido, perfeito objecto concluído, porém com outro que consegue aperfeiçoá-lo cada vez mais; sim, como seja qualquer coisa ao mesmo tempo material e imaterial. Diríamos sobretudo que é energia com matéria. E dizemos energia para não dizermos Alma. A Alma é outra coisa que se junta a todo o exposto como qualidade da concepção humana a enformar a diacronia do trajecto.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Aves e Toupeiras - Daniel Cristal


A toupeira não voa; não a queirais
com asas nos portais. Ela nasceu
para esburacar nossos quintais
e não para voar no ar como Orfeu

Deixai-as esburacar todo o terreno,
não queirais que se elevem no espaço
porque o seu território é lugar pleno
da ave que ilumina o sol baço

A ave voa chilreia canção de fado
saúda todo o dia o seu futuro
e a toupeira lavra mais um furo

A ave e a toupeira não se entendem,
cada qual tem lugar bem reservado
e nem sequer prò mesmo lado pendem.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Ha mais vagas do que vogas - Daniel Cristal


Vivemos ainda hoje sob a influência dos simbolistas. Até certo ponto sob a influência de Charles Baudelaire que percutiu a geração do fim dos anos Mil Novecentos, e a adiantou. A poesia depois do simbolismo jamais foi a mesma. A ordem consciente deu lugar à desordem inconsciente, filtrada na contenção duma estética renovada, que permitiu o excesso alucinado e/ou alucinogenado , mas não o instituiu como lema. Os que a partir dessa época são notáveis sabem controlar a inconsciência ilimitada, e sabem-na estruturar na contenção.

A justo título chamou-se a Stéphane Mallarmé, o Mago do Verbo. Ir ao encontro da essência foi uma incessante procura numa experimentação de correspondências entre significados, significantes e referentes: «Atrás e dentro da rosa, encontra-se o ser ideal de rosa». No seu caso versificador, ele sobrepõe as palavras e confunde-as. A preencher o modo, a musicalidade é um meio poderoso de efeito estético. Rimbaud, na verdade, tornou-se notável no manuseamento instrumental da sonoridade da linguagem, assim como Guillaume Apollinaire. Mas se houve movimentos contra esta vaga e esta voga, como a reacção romana de Moréas, o simbolismo não sucumbiu mais, e depois disso seguiu um curso de evoluções que nunca mais o perderam de vista e referência. Floresceu nos fins do séc. XIX e princípios dos XX, um néo-simbolismo e néo-romantismo, cuja máxima expressão aconteceu em Apollinaire. De Paris estas correntes literárias propagaram-se pelas línguas românicas, culminando em Portugal com a poesia de Camilo Pessanha, que abriu na sequência estética a vaga dos surrealistas lusófonos ainda hoje muito em voga. 

Quando Mallarmé começa a dar os primeiros passos na poesia, invade-lhe a feitura e a admiração artísticas, a obra de Baudelaire e Edgar Poe. Historiando um pouco, registo: Paul Verlaine ganhava fama com edições sucessivas e estreitava com ele (Mallarmé) relações de aproximação. Mallarmé exercia o magistério (Ensino de Inglês) em Liceus e obtinha o reconhecimento dos seus pares: presidia a certames, festividades e celebrações. Em Jan. de 1896 morre Verlaine e nesse mês, Mallarmé é eleito Príncipe dos Poetas e no ano seguinte os jovens discípulos Henri de Régnier, Paul Claudel, Paul Valéry e outros rendem-lhe uma homenagem num álbum de poemas escritos em sua honra. 

Os surrealistas que se lhe seguiram na busca da revolução autónoma da estesia, aproveitaram as inovações arrojadas dos simbolistas. É mesmo Apollinaire que é eleito seu Mestre, ao ser-lhe destacada a apologia do seu poema-testamento «La Jolie Rousse» de Caligrammes : 

Nous voulons vous donner de vastes et étranges domaines 
Où le mystère en fleurs s offre à qui veut le cueillir 
Il y a la des feux nouveaux des couleurs 
jamais vues 
Mille phantasmes impondérables 
Auxquels il faut donner de la réalité... 

Poesia desprovida de constrangimentos a explorar os mistérios residentes no interior do homem, eis, em traços gerais, o lema da nova escola. Era uma procura em conjunto sem vontade de glorificar alguém em particular, os sonhos eram postos a circular, ia-se à procura dos mitos primitivos, sondando sonhos, ilusões de loucos, alucinações de nevrosados, e numa descoberta e conquista, explorava terrenos da psiquiatria: a hipnose, o desdobramento, a histeria, com Freud muito perto desta nova viagem pelo inconsciente - o seu material de estudo e análise. 


Hoje vive-se de influências, sem Escolas imperiosas, na prática. Há mais vagas que vogas. O poeta escolhe o seu percurso, depois de várias experiências. Aliás o surrealismo assim mesmo estabeleceu o modus faciendi : o curso livre - a liberdade na escolha do caminho. E se é livre, também está liberto para reanimar a forma clássica ( como por exemplo desenvolver a melhor estrutura que foi dada a conhecer pelo Renascimento O SONETO, e sagrou tantas gerações de Poetas, até aos e nos nossos dias ); toda a modernidade pode cristalizar-se nessa forma: não deixa de ser uma jóia rara com o gosto duma peça estética actual. E convém ser dito, não exclusiva! - Há Poesia hoje noutras estruturas aligeiradas, em verso livre e solto que são obras primas, especialmente aquela que encontra a cadência ou o ritmo que a singulariza, e transforma - para melhor - a sensibilidade do seu leitor/auditor. E finalmente diria: não é necessário que a Arte seja útil e imediata, ou explícita, também a há que não parecendo ter nenhuma finalidade, existe só por si, e transforma pelo inconsciente a nossa inconsciência, donde a consciência provém, reestruturando-a novamente com a subtileza das coisas leves, insustentáveis. 

domingo, 19 de abril de 2009

Ambiguidade - Daniel Cristal


Amai-vos uns aos outros, disse Cristo!
Frase velha, mais nova que a cultura...
Porque a cultura é outra, menos pura,
e o homem insiste em não ver isto.

Insiste na ganância, no sucesso,
e quer ser superior por modos tortos,
tortos e tortuosos com esforços
de meter no redil os mais ingénuos.

Amai-vos uns aos outros, chave santa,
frase ambígua, engodo e artimanha
para meter na cerca o rebanho...

Se Cristo aqui voltasse hoje em dia
e repetisse igual apologia,
outra vez a via sacra subiria!

sábado, 18 de abril de 2009

Contrastes - Daniel Cristal


Por muito que me queiras amargar,
a minha alma é ditosa e perene;
não sei donde herdei o meu estar
mas deve ser assim por algum gene.

Queres que fique triste e constrangido
porque é assim que vês a tua imagem;
tens inveja de quem é bem querido
e alegra o seu amigo na viagem.

Se eu ficasse triste quando danas,
só porque julgas que o mundo te pertence,
tu ficarias alegre nesse instante!

Mas seria um instante muito ténue
porque a tua amargura é radical:
corrói-te até à medula por sinal.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Na Crença - Daniel Cristal


Vivemos este sonho do amanhã;
ele é a voz de quem assim futura:
a maçã da colheita temporã
satisfaz quem a prova bem madura.
 
Vivemos o momento desfasado
duma luta vadia; essa que exclui
o passo em descompasso, o outro lado
do fio lasso, onde o Amor flui.
 
Vivemos noutro mundo diferente
e de tal modo somos maçã sã,
que o futuro está tão bem presente!
 
Somos fruta madura e temporã,
e a luta vadia a engolimos
na crença do Amor que nós sentimos.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

A Pedra Atirada - Daniel Cristal


A pedra atirada ao nosso dorso,
faz sempre um ricochete surpreendente!
Ela regressa à mão, que fez esforço,
e não sai mais de lá, por mais que tente.
 
Se não gostares, cuida do teu gosto,
porque o teu gostar é muito relativo,
e antes que te percas por desgosto,
não penses que há pra ti paliativo.
 
Pensa bem, outrossim, na dura pedra,
que foi parar outra vez à tua mão,
ferindo-a com o estigma da queda...
 
Ficas com aleijão, ao fim e ao cabo,
amachucas o próprio coração
e deixas o azedume do diabo.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Um pouco mais - Daniel Cristal

 
Um pouco mais de asa, seria ave,
um pouco mais de vento, ventania;
projecto-me no voo da melodia
com o tom que abre a pauta nesta clave.
 
Um pouco mais de asa em movimento
e seria uma ave ou astronave,
capaz de implantar o amor suave,
seja onde for e em qualquer momento.
 
Entrementes, fico sem o argumento
de tudo ser possível ao relento
dum dia que decorra muito lento...
 
Só mais um pouco de asa ou de vento,
 e eu teria o Sol na minha mão
e a Chuva p'ra germinar o coração.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Ser Poeta - Daniel Cristal


Poeta não tem qualquer definição;
pode ser fome, pão ou mão amiga,
pode ser melodia ou canção,
ou chão que dá espiga em vez de urtiga.

Tudo pode ser... menos invejoso, 
mau carácter, vilão ou cobiçoso;
pode ser criatura desolada,
mas nunca a canalha empertigada.

E se for dessa escória que só dana,
que não chateie muito quem bem ama
o seu irmão com mente muito sana;

Porque poeta não é quem se ufana
que é, ou acredita no que é falso,
ou calça o chinelo no percalço.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Com a Rosa - Daniel Cristal


Com a rosa na mão e o seu odor
no coração, não sinto o espinho
cravado no pé coxo, cor do vinho
ou da pena do mocho, indolor.

Com a rosa na mão, sinto o enlevo
duma oração convicta, que no fervor
nos modifica, sendo o amor
a depor no coração novo relevo.

Com a rosa na mão não há espinho
que doa no meu pé boto, nem se sente
o espinho da rosa, nem o piar do mocho.

Porque ela inebria, como faz o vinho,
cresce na luz do dia, afaga a mente,
e dá prazer viver com o pé roxo!

domingo, 12 de abril de 2009

Andrómeda e Teseu - Daniel Cristal

 
Perdi-me neste mar da imensidão...
Perdi-me numa noite! Quem me acode?
Quem me dá a sua mão ou a ilusão
de encontrar uma estrela numa ode?
 
Da palavra ao gesto, use a bússola,
perscrute o espaço de angústia,
descubra a Cassiopeia, a Menor Ursa,
ou a Estrela Polar, a estrela augusta.
 
Mude o rumo e espere a alvorada,
a aurora boreal ou a austral!
Vai nascer uma nova madrugada
com uma outra potência magistral.
 
Se a angústia persistir, palpite ainda
a Estrela da Manhã, ou, em nova sonda
o Cruzeiro do Sul, pois nunca finda
a beleza do Amor... E não se esconda!
 
Não se esconda no incerto deambular
a paixão de Andrómeda e Teseu;
não se esconda da luz, ela é polar,
e norteia ao inverso, tu e eu.

sábado, 11 de abril de 2009

3 Sonetos para a Páscoa - Agnus Dei (3)


Menino, me recordo das tuas asas,
da tua mão protectora, teu sorriso,
que transformava o monte em plano liso,
e uma maré-cheia, numa maré-rasa.

A tua mão conduzia-me com prudência
por veredas brincando com amigos,
à escola da Igreja entre trigos,
e o desvio indicavas na urgência.

Vigilante, oravas pela criança,
por toda a criança, certamente,
pois que todas te amavam cegamente;

E hoje sem já ter muita esperança
dum mundo feito à tua semelhança,
vejo-te à minha frente bem presente. 

sexta-feira, 10 de abril de 2009

3 Sonetos para a Páscoa - Agnus Dei (2)


Ampara-me no acto que aleija,
neste, nesse ou noutro passo incerto.
Ampara-me na vida e fica perto
quando a alma já não sabe o que almeja.

Não te afastes de mim, mantém a Luz,
mantém a crença viva sem parar...
Corra eu no meu rio, ou no teu mar,
garante o direito de ser a quem tem jus.

Oferece a palavra a quem a lavra,
não deixes que abalroem esta senda,
porque o erro aconselha a sua emenda...

Ajuda-me a amansar a gente brava;
essa gente que nunca encontrou
a via, onde feliz, me (a)firmo e vou.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

3 Sonetos para a Páscoa - Agnus Dei (1)


Estão à minha espera os arcanjos
num céu muito estelar, sorrindo sempre;
lêem-me como a virgem no altar
com as damas que cuidam do rebanho.

Quando escrevo, escuto sons de banjos,
uma ou outra lira benquerente,
a voz de várias divas a amar,
pedindo mansidão pelo seu anho.

"Agnus Dei" assim crente, em ti me cerro,
anho mais céu que terra, sem pecado,
tirai a imperfeição que nos sobeja!

A tua mão me proteja quando erro,
corrige-me na crença este meu fado,
ampara-me no acto quando aleija.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Gesto Constante - Daniel Cristal


Não há gesto a perder   mas a ganhar
Trabalho com o afinco   do oleiro
que limpa as impurezas   do seu barro
 
Trabalho a olhar pra dentro    prazenteiro
O que está fora morre   Não o agarro
E em função da Beleza   me abeiro
 
Faço o que faz o grão   a fermentar
Da mão me sai o Amor   bem   por inteiro
Neste constante gesto   a semear

terça-feira, 7 de abril de 2009

RirAmar - Daniel Cristal

 
Riremos dos nossos jeitos imperfeitos
riremos dos seus efeitos desastrados
da tua languidez serena antes dos feitos
da minha energia e gostos facultados...
parecidos tolos rindo de sevícias:
do meu sono após a funda erupção
do torpor do modo findo das carícias
as quais trariam mais amor à emoção!


Quero a tua boca haurindo erogenias
não deixando o plexo fora dessa acção!
Queres comprazer secreta fantasia
que te ponha ao rubro e prenhe o coração!
Oh, que RirAmar depois da sinfonia!
Quanto cio gerado nestas sintonias
brindando-nos com delícias amplos dias?!


Ficamos tenazes, ternos e potentes
capazes de amar sem nunca mais parar...
Ficamos a ver auroras e poentes
no meio dos nossos êxtases sem par...
De toda a criação, seremos diferentes!
Nunca perderemos esta grã ternura!
O riso impede de sermos quaisquer doentes
sujeitos ao vil escárnio e à censura!

Rindo e rindo agora e sempre da loucura
não haverá macho fêmea distinguindo
este desempenho tão feito doçura...
Será a empatia crescente num modo lindo
nosso amor será pra sempre uma ternura
uma união eterna em cada instante findo
- o maior exemplo crido na demência
dos que andam perdidos longe desta essência.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Companheira - Daniel Cristal


Advieste na esperança do futuro
muito subtil na extrema confiança
de que a vida pode ser a dança
capaz de derrubar um duro muro.
 
Adoptaste os deuses que adoptei:
os nossos mortos-vivos, a mãe única,
o amuleto-rei sobre a túnica
pautando a regra justa ou a sua lei.
 
Foste no meio dos mitos, o meu mito,
mulher que me conteve na redoma,
onde vive alegre o teu genoma.
 
Nunca medi o amor... não tem medida!
Preenche sempre a parte da lacuna
como a areia móvel duma duna.

domingo, 5 de abril de 2009

Poesia Ecoante - Daniel Cristal


Se não fosse a luz intensa da Poesia
este vento feliz de encantamento
nada renovaria o mundo imundo
com guia sem lamento mas fecundo.

E o eco que transmite dia-a-dia
na Humanidade é a causa do que seja
Amor a sobejar nesta amargura 
que aqui é alegria em peleja pura...

Há quem ouça este eco neste tom
quem viva com atenção ao que o rodeia
e é na comunhão que sente esse retorno
pois o que é bom é a ideia sem estorno;

O estorno e a ganância do poder
a subjugação ao esperto que explora
é o que aprisiona numa norma
que no ser se deita fora e o informa.

sábado, 4 de abril de 2009

Miragem Colorida - Daniel Cristal


É a colorida miragem no deserto
quando se está sequioso e carente,
uma miragem que abençoa a agonia,
mas não é mais que isso, muito perto.

Não vale a pena confundir o que confunde
porque confundido está quem se confunde;
é como ir na baixa-mar ao seu destino,
ir e velejar e nunca mais voltar...

E por mais que digam que o sonho é bom,
e todos estão ao nosso alcance,
nem todos são assim, e também morrem
por neles vermos só aquilo que queremos.

E porque são miragem, brilham no deslumbre,
mas, a realidade é outra, outra tal e qual
por mais que a queiramos colorida,
ela fixa, a exaurir, a nossa vida.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

O Ser - Daniel Cristal


Ninguém alguma vez, ousou dizer:
a terra é velha; velho é o sal...
Dado que a essência é intemporal
e não há melhor bem que assim ser.
 
Em tempo algum alguém ousou dizer:
é velho o universo ou sua mente,
e se alguém o ousou não era gente
mas algum renegado do que é ser.
 
O ser não acaba hoje, não tem fim
nem teve início, faz parte do eterno
conjunto que tem a alma por afim.
 
Chamar velho ao homem ou à mulher
é falta de decência e de saber,
a ignorância da essência do seu ser.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

A Poesia é um Templo - Daniel Cristal


Entro no sagrado Templo com a alma
alegre e feliz por ser a salvação
da contradição; por ser esta amálgama
em que ómega e alfa são uma união;
alegre e feliz eu entro em efusão.

Feliz é o estado simples que me habita
da alma ao coração: o estado mais querido
em que o que se quer, nos é oferecido.
Alegre porque é o impulso duma vida
que festeja o facto belo, o mais sentido.

A Poesia é um Templo nu, sem ornamento;
é o alimento único ao sustento
dum sedimento que anula o sofrimento
do ser, do fingir, do agir, com o unguento
que transforma em paz o íntimo violento... 

Entro no sagrado Templo com a paz
do Amor, promovendo a festa da existência
numa dependência simples, como faz
o coro da Igreja única, essência,
mãe e virgem santa, pura benquerença.

A Poesia perfuma a vida, colora o ser,
musica a alegria, cativa a alma aberta,
seduz todo o Bem que envolve o crer e o parecer,
amalgama todo o Amor na gama certa,
substitui o mal do ser por grande festa

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Este Momento - Daniel Cristal


Este momento pode ser o evento
que recusa o lamento... Um novo vento
abrindo uma janela para a vida
e dentro dela ficar agradecida.

Este momento pode ser o início
da mudança futura, o fim do mundo
da amargura, o instante mais propício
para agarrar feliz o ser profundo.

É um acontecimento este momento...
E vai, porque eu quero, ser mais lento
Do que o agitado vento, que me invade...

Ele é o início rápido da mudança,
A certeza de que não há idade
Para tornar a vida numa dança.