Que simpático o José
Parecia bailarino
Vivia com muita fé
Tinha corpo franzino!
Ele era homem pacato
Trabalhava com afinco
Era humilde de facto
A casa dele era um brinco
Como gostava do José!
Era de aspecto franzino
Estóico de boa fé
Corpo belo pequenino!
Casado com minha tia
Admirava-lhe a mão!
Que mão apurada tinha!
Nunca lhe faltou afeição...
Que simpático o José
Parecia bailarino
Vivia com muito afã
Tão pequenino e franzino
Com a plaina alisava
Qualquer madeira rugosa
E co' verniz que lhe dava
Assim ficava lustrosa
Quatro filhos bem crescidos
Duas mulheres e dois homens
Bem nutridos parecidos
Sãs figuras então jovens.
Nos arraiais (era certo!)
Trazia com ele os jograis
Um sorriso sempre aberto
Seu harmónio era demais
Como gostava do José
Ele era homem franzino
Estóico de boa fé
Corpo belo pequenino
.
Em casa ao entardecer
Havia sons de alegria
Risos de bem-querer...
Hoje são nostalgia!
Carpinteiro José mestre
Querido do povoado
No tempo morno ou agreste
Exercitava afinado
Tinha mão que apresentava
Dedos encantadores
No acordeão dedilhava
Canções de eternos amores
Nele o José musicava
Os sons mais fortes e frágeis
Tirolirando cantava
Dedos finos dedos ágeis
Que simpático o José
Parecia bailarino
Vivia com muita fé
Tinha corpo franzino!
Tocava bem o José
As modas da minha aldeia
Os dedos do próprio pé
Cadenciavam em cadeia!
Ouviam-se ecos num fio
Pelas colinas do rio
Cantigas ao desafio
E canções em corrupio
O seu mister foi mistério
Foi madeira torneada
As suas notas, minério
Da existência realizada
Era um estóico este mestre
Comia numa tigela
Vencedor do Inverno agreste
E todo o frio que gela
Quando morreu este mestre,
Morreu na aldeia a magia
Na dor de algum cipreste
- A mais bela poesia!
Foi então que nesse dia
Em que seus dedos pararam,
Morreu também a alegria
E cobriram-no de cravos!
Que simpático o José
Parecia bailarino
Vivia com muita fé
Tinha corpo franzino!
Ah, carpinteiro beirão
Mestre do acordeom
Tinhas mestria na mão
Tal a madeira com som!
Digitavas no marfim
Do acordeom que fizeste
As pautas belas sem fim!
Tanta alegria nos deste!
Ó ti mestre carpinteiro
Acordeonista a valer
Tinhas o dom do feitiço
Encantavas qualquer ser!
.
Fosse num simples madeiro
Fosse no harmónio a soar
Tinhas prodígio altaneiro
Fazias donzelas casar...
E como foste (que grande perda!)
Numa noite
Com luar
e os lobos
angustiados
a uivar!
Levaste o nosso carinho
Quanta beleza nos deste
Azedou por ti o vinho
Numa invernia agreste!
Com ele morreu a alegria
Na minha aldeia natal
De luto ficou a poesia
No meu rincão natural.
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