A Mário Sacramento, Clara Sacramento e David Cristo
uma salina ao lado e ao longe um cone ao perto uma pirâmide a imprimir-se no espaço e no tempo nas noites de luar um triângulo a projectar-se até na Lua e nos planetas
no cimo uma vela olhá-la foi espanto a brancura feria os olhos o branco era o sal e a pirâmide erguera-se da água salgada a aspirar novo ciclo cidade anfíbia a arrebatar o sangue recirculado
o moliceiro levava a vela desfraldada de repente a brancura voltou a ferir então no profundo o branco era a vela e o monte de sal
o Sol deitava-se no cimo da pirâmide um globo perpetuava o eterno e efémero ciclo diurno em toda a parte um cântico litoral a redobrar o seu som perdido na esperança duma aurora nascitura
era Aveiro a deusa anfíbia de Portugal no interior dum grande silêncio vespertino era ela no círculo o monte de sal e o moliceiro era ela a ofertar um novo caleidoscópio a fazer renascer novas formas ignoradas e novas harmonias
adoráveis pirâmides e rectângulos raras e exóticas linhas geométricas...
amor estampado nos pares de namorados a olhar o deitar do Sol no horizonte manso semicírculo a perder na memória a esfera encarnada a encimar o vértice branco num clarão litoral de proximidade e distância...
1 comentário:
“Cântico Litoral” é, seguramente, o melhor texto poético que alguma vez foi escrito sobre a Ria de Aveiro, com as suas pirâmides de sal, misturando-se com os moliceiros, de brancas “velas desfraldadas”, e o amor a ‘espreitar’, numa sugestão pictórica de uma beleza estonteante.
Um poema-prosa que é um ‘cântico’ de exaltação da paisagem que nos é dado visualizar com a emoção que suscita o mais belo quadro impressionista.
Que dizer da riqueza do léxico e da originalidade da imagística?!
Ainda bem que a pontuação não está visível – distrairia o ‘olhar’, a contemplação.
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